quinta-feira, 18 de abril de 2024

autoanálise

 


Conheça-se a Si Mesmo, da psicanálise à psicoterapia psicodélica


Karen Horney, nasceu em 1885 em Blankenese, Hamburgo, foi uma psicanalista alemã importante, autora de obras como "A Personalidade Neurótica de Nosso Tempo" (1937) , "Novos Caminhos em Psicanálise" (1939) e o controvertido Auto análise, conheça-se a si mesmo (1942).

Depois de se formar em medicina, Horney foi treinada em psicanálise com Karl Abraham e entre 1920 e 1932 e lecionou no Instituto de Psicanálise de Berlim, enquanto assistia aos pacientes. Em 1934 ela se mudou para New York, onde começou a lecionar na New School for Social Research.

Ensinou durante vários anos no New York Psychoanalytic Institute, em 1941 foi expulsa da instituição, então decidiu criar a Association for the Progress of Psychoanalysis (Associação para o Progresso da Psicanálise).

Juntamente com Erich Fromm (1900-1980) integra o grupo identificado como psicanálise culturalista e/ou teoria sócio-psicológica. Para alguns Karen Horney foi talvez a primeira psicanalista humanista. Suas teorias são inteiramente compatíveis com as de Abraham Maslow (1908-1970).

Um dos célebres autores influenciados por ela foi Timothy Leary, (1920 - 1996), psicólogo da Universidade de Harvard (1959-1963), expulso por suas experiências com o LSD no advento de sua proibição (1963). Roemer destaca a aplicação dos modelos interpessoais desenvolvidos por Karen Horney e Timothy Leary para analisar padrões de personalidade e comportamento.

Timothy Leary recebeu um diploma de M.S. em psicologia na Washington State University em 1946 e licenciatura em psicologia clínica na Universidade da Califórnia, Berkeley, em 1950. A dissertação de seu seu Ph.D. foi intitulada "As Dimensões Sociais da Personalidade: Estrutura e Processo de Grupo. "

Depois de receber seu diploma de graduação (em agosto de 1945), Leary seguiu a carreira acadêmica, expandiu a pesquisa de Harry Stack Sullivan e Karen Horney, que buscaram compreender melhor os processos interpessoais para ajudar a diagnosticar transtornos mentais e de personalidade. A dissertação de Leary desenvolveu o modelo "circunplexo interpessoal", publicado mais tarde em seu livro, The Interpessoal Diagnosis of Personality.

Horney e Leary podem ser designados como precursores dos estudos sobre a autoanálise e a terapia assistida por psicodélicos, considerando a hipótese de que os psicodélicos facilitam o surgimento de material inconsciente carregado de emoção, o que veio a ser a proposição do também pesquisador pioneiro em psicodélicos Stanislav Grof.

O livro de Horney, "Self-analysis", 1942 (Conheça-se a si mesmo, auto análise) publicado no Brasil em 1964, está dividido em onze capítulos, distingue a auto-análise esporádica da sistemátlca (equivalente talvez ao que se realiza em sessões coletivas de meditação com psicodélicos), analisa sua praticabilldade, conveniência e limitações.

Partindo da compreensão da teoria psicanalítica e a função do analista (e fases da análise) evidencia o valor da descoberta do inconsciente (as förças propulsoras das neuroses), e fundamentando-se na metodologia clínica das histórias de vida e estudos de caso, propõe um método ou regras para avaliação sistemática das relações interpessoais e vivências a serem trabalhadas no processo de autoanálise, visando desenvolver a "capacidade de amar" (uma proposição da psicanálise freudiana), ou um melhor relacionamento consigo mesmo e com os outros, considerando o conjunto de necessidades do Self (Ego na teoria psicanalítica), análogo ao conhecido modelo da hierarquia das necessidades de Maslow.

O desenvolvimento da capacidade de autoanálise, autoconsciência e auto cuidado segundo diversos autores como Lindegaard e Gobbi et al., vem sendo estudado por diversos pesquisadores da medicina psicodélica, (inclusive pesquisadores do uso religioso da ayahuasca no Brasil (Maia et al.). O uso do termo "psicodélico", proposto pelo psiquiatra Humphrey Osmond em 1957 vem da composição das palavras gregas psique (ψυχή - alma) e dilein (δηλειν - "ou seja", revelação). A interpretação dos sonhos pode ser considerado um parâmetro para análise do conteúdo das visões.

A importância de Karen Horney portanto vem não só de sua influência sobre Timothy Leary e consequentemente na psicoterapia psicodélica, mas também por ser precursora da proposição de autoanálise, (em 1942) desafiando as proposições ortodoxas da psicanálise e nos remetendo ao paradoxo da terapia psicanlítica que de certo modo fundamentar-se na autoanálise de Sigmund Freud (1856-1939).

Saigh assinala que, embora Freud tenha feito ele mesmo sua análise, ele tinha um interlocutor, o médico, seu amigo e correspondente Wilhelm Fliess, (1858-1928). Observa que em duas das muitas cartas que escreveu a Fliess, mostrou-se ambivalente sobre a crença na eficácia da auto-análise que empreendeu, chegando a afirmar ..."uma genuína auto-análise é impossível, do contrário não existiria a neurose". Saigh, 2007.

Por outro lado um estudo de seguimento realizado em Estocolmo, comparando a psicanálise com psicoterapia de orientação psicanalítica de longo prazo, concluíu em um dos resultados que os pacientes de psicanálise continuaram a melhorar após o término em um grau mais elevado do que os pacientes de psicoterapia de longo prazo. Possivelmente em função do desenvolvimento da capacidade de autossuficiência descritas por ex-analisandos, mas não por ex-pacientes de psicoterapia. Sendo que apenas a auto-análise foi significativamente correlacionada com a melhoria pós-rescisão em ambos os tratamentos. (Falkenström, et al. 2007).

REFERÊNCIAS

Karen Horney (1885-1952)
International Karen Horney Society
http://plaza.ufl.edu/bjparis/ikhs/horney/fadiman/01_intro.html

Karen Horney. Conheça-se a si mesmo (auto análise). RJ: Civilização Brasileira, 1964

Aydin, Serdar; Ceylan, Hasan Huseyin; Aydin, Erhan (2014). A Research on Reference Behavior Trend According to Horney's Personality Types. Procedia - Social and Behavioral Sciences, 148(), 680–685. doi:10.1016/j.sbspro.2014.07.014
https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1877042814039184
Falkenström, F., Grant, J., Broberg, J., & Sandell, R. (2007). Self-Analysis and Post-Termination Improvement After Psychoanalysis and Long-Term Psychotherapy. Journal of the American Psychoanalytic Association, 55(2), 629–674. doi:10.1177/00030651070550020401
url to share this paper: https://sci-hub.yncjkj.com/10.1177/00030651070550020401 Sci-Hub is a project

Gobbi G, Inserra A, Greenway KT, Lifshitz M, Kirmayer LJ. Psychedelic medicine at a crossroads: Advancing an integrative approach to research and practice. Transcult Psychiatry. 2022 Oct;59(5):718-724. doi: 10.1177/13634615221119388. Epub 2022 Oct 19. PMID: 36263521; PMCID: PMC9663823. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC9663823/

Lindegaard T. Do Psychedelics Facilitate Emergence of Unconscious Psychological Processes? Psychodyn Psychiatry. 2023 Sep;51(3):270-286. doi:10.1521/pdps.2023.51.3.270. PMID: 37712665.
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/37712665/

Maia, Lucas Oliveira; Dias, Camila; Valêncio, Luis Felipe; Tófoli, Luís Fernando. orgs.). Visões multidisciplinares da Ayahuasca. SP: Unicamp, 2024

Roemer WW. Leary's circle matrix: a comprehensive model for the statistical measurement of Horney's clinical concepts. Am J Psychoanal. 1986 Fall;46(3):249-62. doi: 10.1007/BF01250973. PMID: 2430473. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/2430473/

Roemer WW. An application of the interpersonal models developed by Karen Horney and Timothy Leary to type A-B behavior patterns. Am J Psychoanal. 1987 Summer;47(2):116-30. doi: 10.1007/BF01253025. PMID: 3618840. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/3618840/
Saigh, Yeda Alcide. A auto-análise 150 anos depois de Freud. Psyche (Sao Paulo), São Paulo , v. 11, n. 20, p. 117-128, jun. 2007 . Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-11382007000100008&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 23 ago. 2020


VER TAMBÉM

MARUCCO, Norberto C.. A análise do analista: análise didática, reanálise, auto-análise. J. psicanal., São Paulo , v. 41, n. 74, p. 187-196, jun. 2008 . Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-58352008000100013&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 23 ago. 2020.

ANZIEU,  Didier A auto-análise de Freud e a descoberto da psicanálise – 2 volumes. Pt: Editora Edições 70, 1990

PIERRE BOURDIEU
Esboço de auto-análise.

Almeida, B. G. M. de .. (2006). Os limites da auto-análise. Revista De Sociologia E Política, (26), 125–129. https://doi.org/10.1590/S0104-44782006000100009
https://www.scielo.br/j/rsocp/a/gNk7JgYTLLSQcS8DPtBjHhm/

Rosa, A. R.. (2007). Esboço de auto-análise. Revista De Administração Contemporânea, 11(2), 239–241. https://doi.org/10.1590/S1415-65552007000200014
https://www.scielo.br/j/rac/a/XtpqxwHxvwGfnty3Ht5cqfP/

ILUSTRAÇÃO

Detalhe de mandala de C.G. Jung no Livro Vermelho

O aforismo do grego antigo "conhece a ti mesmo" (grego: γνῶθι σεαυτόν, transliterado: gnōthi seauton; também ... σαυτόν ... sauton com o ε contraído), é uma das máximas délficas e foi inscrita no pronau (pátio) do Templo de Apolo em Delfos de acordo com o escritor Pausânias (10.24.1). Em latim a frase, "conhece a ti mesmo", é geralmente dada como Nosce te ipsum

Ruínas do Templo de Delfos/ wikimedia commons

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